Descanso: como desacelerar e deixar os momentos de pausa mais restauradores
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Descanso: como desacelerar e deixar os momentos de pausa mais restauradores

por Larissa Nara

Você se sente descansado? Provavelmente não. Com a rotina agitada, distraída e absolutamente ocupada (pelas tarefas, estímulos ou pensamentos), a ideia de estar com 100% de energia parece um sonho distante – para não dizer impossível. Não à toa, depressão, ansiedade e burnout são temas cada vez mais urgentes, especialmente após a pandemia. Segundo um estudo mundial sobre estresse e burnout, realizado em 2021 pela Harris em parceria com a Microsoft, o Brasil lidera o ranking, com 44% da população afetada pela síndrome, seguido por Singapura (37%), EUA (31%) e Índia (29%).

Diante desse cenário, os benefícios de uma boa (e bem-feita) pausa tem ganhado cada vez mais atenção, inclusive dentro das empresas. Em alguns países como Bélgica, Japão, Dinamarca e Islândia, a redução da jornada de trabalho, sem alteração salarial, para quatro dias, ao invés de cinco dias, já é uma realidade que tem como propósito ajudar as pessoas a driblarem um pouco a sensação de esgotamento. Já no Canadá, por exemplo, profissionais da saúde começaram a prescrever momentos ao ar livre nos parques nacionais como parte do tratamento de quem sofre com exaustão física e mental.

Para além de uma boa noite de sono, descansar pode ter a ver com muitas coisas: de não ler ou responder aquele e-mail a não planejar o futuro ou, simplesmente, viver o puro ócio. Em seu livro “Sacred Rest: Recover Your Life, Renew Your Energy, Restore Your Sanity”, ainda sem tradução em português, a médica e pesquisadora estadunidente Saundra Dalton-Smith, que inclusive ganhou mais notoriedade após fazer um TEDx Talk sobre o tema em 2019, vai além e diz que, o antídoto para o esgotamento não está apenas ligado a dormir ou tirar férias, mas tem a ver com saber identificar os tipos de descanso de que você mais precisa e adotar pequenas estratégias diárias para reabastecê-los. “Há sete tipos diferentes de descanso: físico, mental, espiritual, emocional, social, sensorial e criativo. Cada tipo de descanso tem suas próprias características que se manifestam quando há um déficit”, diz em publicação do Goop. Em sua abordagem, até reduzir o excesso de estímulos sensoriais no ambiente entram na lista.

De acordo com Nina Ferreira, psiquiatra especialista em terapia esquema, neurociência e neuropsicologia em São Paulo, para descansar de verdade é preciso entender primeiro onde a gente está para entender qual papel a pausa terá. “O descanso depende do quanto a gente se cansa, do quanto a gente se ocupa. Para manter saúde mental é preciso ter um balanço entre a atividade do cérebro, que não tem a ver só com trabalho, mas com tudo o que a gente faz de forma ativa, e os momentos de não ocupar o cérebro, ou seja, de descansar”, explica.

Pausa (mais que) necessária
Uma pesquisa realizada pelo Centro de Sono e Cognição da NUS Medicine, nos Estados Unidos, mostrou que tirar uma soneca ou pequenos cochilos curtos durante o dia pode ajudar a melhorar a produtividade e a memória. No estudo, 32 voluntários foram submetidos a quatro condições experimentais — vigília e cochilos de 10, 30 e 60 minutos em dias alternados — e fatores como humor, sonolência objetiva e, após o despertar, o desempenho cognitivo de cada um foi medido em intervalos de 5 minutos, 30, 60 e 240 minutos para avaliar os possíveis benefícios da soneca. Os resultados mostram que, em comparação com a vigília, as sonecas tiveram benefícios claros na melhora do humor e no estado de alerta, sendo que só as pausas de 30 minutos afetaram diretamente o desempenho da memória.

Para a psiquiatra, como depois do almoço o corpo está tentando digerir o alimento e já está um pouco cansado pela rotina da manhã, fazer esse tipo de descanso por 10 a 15 minutos pode ser bem eficaz. “Não é uma regra que vai funcionar para todo mundo, mas é válido para quem puder experimentar e entender como se sente depois”, recomenda. “O funcionamento do corpo e do cérebro gera lixo no organismo. Então quanto mais horas a gente está trabalhando, mais lixo a gente tem nas células e, nesses momentos de descanso, é quando o corpo tem a oportunidade de fazer essa varredura do lixo”, continua.

Daniele Damata, maquiadora e empresária à frente da DaMata Makeup, é adepta da prática e conta que, sempre que pode, gosta de tirar um cochilo à tarde, especialmente nos dias pós-terapia. “Na pandemia, quando eu comecei a fazer terapia, percebi que precisava de um tempo depois, sem qualquer intervenção de trabalho, para elaborar tudo melhor e notei que sentia muito sono também. Então, durante a semana, especialmente às sextas, passei a incorporar na rotina algum momento de descanso, longe do trabalho. Seja tirando uma soneca ou fazendo uma massagem, diz sobre os hábitos que adquiriu pós-pandemia e que, atualmente, ainda tenta encaixar na rotina, mesmo que não com a mesma frequência. Além disso, ela passou a estender a prática da desaceleração àqueles que trabalham com ela, deixando, sempre que possível, as sextas-feiras mais livres. “Em geral, só alinhamos pontualmente algumas demandas a serem resolvidas depois”, conta.

Para quem não tem a oportunidade de cochilar no meio do expediente, Nina Ferreira diz que vale fazer pequenas pausas de cinco minutos entre as atividades no computador ou celular, por exemplo, para descansar o cérebro. “No meio do trabalho, quando nos percebemos cansados, vale fechar os olhos uns minutinhos, sem olhar para o computador ou para o telefone, e deixar os pensamentos fluírem, sem se apegar a eles. A prática é inteligente de se fazer, inclusive, para ajudar na produtividade”, completa.

Entretenimento x descanso
Se a sua ideia de descansar no fim do dia ou da semana só tem a ver com deitar na cama e assistir uma série ou rolar o feed das redes sociais para passar o tempo, vale repensar. Embora seja comum confundir um com o outro, entretenimento e descanso são bem diferentes. “Descanso para o cérebro significa não cobrança ou não ocupação. Quando vamos assistir um filme ou até ir a uma festa, ainda estamos em atividade, ocupando o cérebro, mesmo que seja com algo prazeroso e importante. Mas, para descansar de verdade, é importante não ter um objetivo específico”, explica Nina.

Antes da cama
Com o cair do dia, é ainda mais importante criar uma rotina de desaceleração, com luz baixa e atividades de baixa intensidade. Vale dar aquela organizada básica na hora de dormir, eliminando todas as distrações e criando oportunidades para que o cérebro aprenda que aquele momento é para relaxar e desligar. “O cérebro não foi feito para ser hiper estimulado o tempo todo e o grande problema do celular é que, independente do que você esteja fazendo com ele, você está usando o cérebro, demandando interação e atividade”, diz a médica.

Satyanatha, monge, mestre em meditação e autor do (ótimo) livro “Seja Monge”, tem uma ótima prática para quem demora a pegar no sono ou vive sobressaltada, pensando em tudo o que vai ser preciso realizar no dia seguinte: fazer um banho mental, uma faxina nos pensamentos antes de deitar. Desligue a TV e o celular, abra espaço para fazer nada, revisitar o dia e suas emoções”, indica.


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